segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

OS FILMES DO MEU ANO



  1. Another Year, Mike Leigh

  2. Die Fremde, Feo Aladag

  3. Sangue do Meu Sangue, João Canijo

  4. A Separation, Asghar Farhadi

  5. Pina, Wim Wenders

  6. Tuesday, After Christmas, Radu Muntean

  7. Habemus Papam, Nanni Moretti

  8. Oslo, August 31st, Joaquim Trier

  9. Melancholia, Lars von Trier

10. This Is Not a Film, Jafar Panahi

domingo, 18 de dezembro de 2011

MEMÓRIA DE PEIXE E OSSO VAIDOSO



Foi no passado dia 15 que os Memória de Peixe - Miguel Nicolau e Nuno Oliveira - subiram ao palco do Musicbox, para apresentar o seu EP de estreia, a ser lançado lá para meados de Janeiro pela Lovers&Lollypops. Foi maravilhoso ver a transformação das suas músicas em palco, como estes homens-peixe tomaram conta do seu aquário e rapidamente o encheram de ondas, enrolando o público na sua dança. Ouvir os loops de guitarra do Miguel é bonito, mas vê-lo a fazer aquilo é realmente outra batalha naval. E o Nuno dá porrada com fartura na bateria. Da Chick juntou-se a eles no tema Fish&Chick e conquistou a nossa atenção com a sua voz impactante. Aqui fica uma pequena amostra do que foi.




A seguir, Ana Deus e Alexandre Soares (ex-Três Tristes Tigres) subiram ao palco munidos de uma guitarra acústica e outra eléctrica, para apresentarem o álbum Animal, lançado pela Optimus Discos e filho do seu mais recente projecto Osso Vaidoso. A voz da Ana não estava nas suas noites, mas ainda assim era belíssima. Pena o barulho de fundo, do público à conversa. O espaço não os acarinhou, é concerto que pede um lugar mais intimista, rabos sentados no chão, silêncio e branda luz. Para que só atentemos no inigualável soletrar da Ana e nos dedos do Alexandre à guitarra (acústica). As letras da Regina Guimarães, são para ser escutadas com atenção.




Fotos de Graziela Costa

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

A SEPARATION, Asghar Farhadi



Quinto filme do realizador iraniano, é o primeiro de sempre a arrecadar três ursos no Festival de Berlim - melhor filme, melhor actor e melhor actriz. A tensão que se sente do princípio ao fim, contém-se a uma explosão. A dor está magistralmente patente na expressão da figura central - a filha do casal - sempre de costas tortas, encolhida sobre si mesma, mas com uma nítida percepção dos acontecimentos, que a fazem perceber como os valores que os seus pais liberais lhe transmitiram não são assim tão lineares. Um conflito entre modernidade e tradição, razão e religião, que se escusa a apresentar culpados ou inocentes. Os personagens tomam decisões e actuam de acordo com os seus princípios. Estreia amanhã. Análise integral aqui.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

VIAGGIO IN ITALIA (1953) Roberto Rossellini

Rossellini era um cineasta intrinsecamente relacionado com o contexto em que a Itália vivia. A impossibilidade de um equilíbrio reflecte o desencantamento da Europa do pós-guerra, e aí a reconstrução económica através do Plano Marshall contribuiu para o declínio da sensação catastrófica no neo-realismo italiano.
Aquando do lançamento de Viaggio in Italia, Rossellini disse que se o neo-realismo é o reflexo da realidade e a realidade mudou, também o estilo deveria mudar.
O crítico francês Alain Bergala afirmou que “la Voyage est le premier filme moderne” – o filme que influenciaria toda a modernidade, especialmente a nouvelle vague francesa.
Rossellini opta por uma história simples, para dar ênfase ao modo de filmar, tendo em conta o local onde a acção se desenvolve. Ingrid Bergman e George Sanders personificam um casal inglês que faz uma pequena viagem por Itália, até Nápoles, de encontro a uma quinta que herdaram e querem vender. A viagem começa por ser prazerosa, mas rapidamente esse sentimento se desfaz para dar lugar à incompreensão entre ambos, resultante da sensação de estranheza, num país com costumes tão diferentes dos seus. Essa sensação é vivida diferentemente por cada um deles, tornando-os em dois estranhos. Ao perceberem que não têm mais nada a dizer um ao outro, cada um segue o seu rumo. A partir daí, Rossellini filma a sua trajectória individual, através da paisagem napolitana, pela qual se dão conta do vazio e fragilidade que sentem.
No final, o casal reconcilia-se. Rossellini acaba por defender os valores do matrimónio e da fé, numa fase de crise com a sua própria mulher Ingrid Bergman.
“Parece-me impossível ver Viagem em Itália sem sentir em cheio a evidência de que este filme abre uma brecha por onde todo o cinema deve passar, sob pena de morte.” (Jacques Rivette, Cahiers du Cinema)
“Filme de confissão e da fé reencontrada, Viagem em Itália é mesmo a obra de um asceta que, na sua encenação recusa a encenação, na sua intérprete e esposa nega a estrela em cada plano.” (Michel Grisola, Ficha Casterman)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

LADRI DI BICICLETTE (1948) Vittorio de Sica


Depois da queda de Mussolini passa-se fome em Itália. Os subúrbios estão cheios de operários sem trabalho, meninos sem escola e mães que percorrem longas distâncias para conseguir água. Antonio Ricci, Maria e Bruno vivem num destes subúrbios de Roma. Antonio consegue trabalho a colar cartazes e Maria vende os últimos lençóis para que o seu marido compre uma bicicleta, indispensável para ocupar o seu posto. No seu primeiro dia de trabalho roubam-lha. Antonio fica desesperado e sabe que tem de encontrá-la se quiser alimentar a sua família. Somos então encaminhados nessa jornada contra o tempo, pelas ruas de uma Roma doente, por onde caminham homens e mulheres gastos pela dor e pelo sacrifício.
Como em tantos outros filmes desta época, os actores não são profissionais. Antonio era, na verdade, um operário que acompanhou o seu filho a uma prova de casting, para o papel de Bruno, e despertou a atenção de De Sica pela autenticidade dos seus gestos. Esta geração de realizadores considerava necessário recrutar actores não profissionais entre os verdadeiros operários, uma vez que se queriam criar personagens que representassem fielmente um grupo social.
Este filme está repleto de detalhes e pequenas situações que comovem o espectador. A imagem de Bruno a limpar a bicicleta do pai é magnífica, sinal de admiração pelo seu herói.
No final, Antonio encontra-se desesperado por não encontrar a sua bicicleta e, ao ver uma fileira delas num parque de estacionamento junto de um estádio de futebol, a tentação apodera-se dele e rouba uma. Alguém se apercebe do sucedido e, num piscar de olhos, a multidão saída do estádio cai em cima dele, humilhando-o. Bruno assiste a tudo e a desilusão marca-lhe os olhos. O pai deixa de ser herói para ser ladrão.
De volta a casa, Antonio não consegue dizer nada ao filho, tal é a vergonha que sente por o ter decepcionado. É então que Bruno pega na mão do pai, compreendendo que mais do que um herói, Antonio é um companheiro que ele quer amar.
De Sica foi também o produtor deste projecto, arriscando o seu próprio dinheiro. A aposta foi ganha, não em Itália, mas nos Estados Unidos, onde obteve o Óscar de melhor filme estrangeiro.
 “A gentileza napolitana de De Sica torna-se, graças ao cinema, a mais vasta mensagem de amor que os nossos tempos tiveram a felicidade de receber depois de Chaplin.” (André Bazin, Qu’est-ce le Cinema?).

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

OSSESSIONE (1943) de Luchino Visconti



Primeiro precursor autorizado do neo-realismo italiano, Ossessione foi adaptado da novela de James M. Cain, The Postman Always Rings Twice.
Com trinta anos, Visconti mudou-se para Paris e foi ajudante de realização de Jean Renoir, em Une partie de campagne. Passados seis anos, decepcionado com Hollywood, realizou este filme.
“Dos filmes ganhei, sobretudo, o compromisso de contar histórias de vida de pessoas: homens que vivem nas coisas, não a coisa mesma. O cinema que me interessa é um cinema antropomórfico”. Publicado em Setembro de 1943 na revista Cinema, da qual foi editor, Visconti manifesta-se quanto à sua ideia de neo-realismo. A visão da realidade é intrínseca à sensibilidade artística do seu autor. Em Ossessione, a vida aventureira opõe-se à estabilidade burguesa. O amor e a violência instintiva fazem parte da sedução e do adultério, reforçando uma visão “aristocrática de esquerda” por parte do realizador.
Foi largamente discutido pela imagem que dava de Itália, ainda em domínio fascista. Até aqui, o cinema italiano representava-se em comédias ligeiras de ideologia pequeno-burguesa, ou em filmes de propaganda de uma Itália “heróica e sã”.
Ossessione veio romper com esse mundo, ao escolher a cidade de Ferrara, com gente e espaços reais. Pela primeira vez, representa-se com um realismo quase documental a cidade e os seus arredores, mostrando a vida quotidiana tal como ela é. Tratam-se problemas psicológicos que importam às classes populares, tendo por trás a história de um casal de amantes malfadado.
Visconti situa as suas personagens numa Itália rural miserável. Os personagens movem-se no seu meio, e nesse sentido utiliza a profundidade de campo para mostrar todas as acções que ocorrem naquele espaço.
As interpretações de Clara Calamai e Massimo Girotti são impressionantes, numa história sensual onde os personagens são tudo menos glamorosos. Os amantes Gino e Giovanna reúnem-se na cozinha da pousada que esta dirige com o marido. Gino pede a Giovanna que fuja com ele, mas ela conhece o seu carácter aventureiro e nega-se a fugir, preferindo a estabilidade que Bragana tem para lhe oferecer. Tempos mais tarde encontram-se na cidade. Bragana está bêbado e participa num concurso de canto. Os amantes levam a cabo o plano de o matar através de um acidente de automóvel, escolha que só serviu para acentuar o sentimento de culpa. A relação desmorona-se e acabam por ficar sozinhos.
Giovanna e Gino são personagens trágicos, incapazes de encontrar um espaço onde ambos se possam situar. Ela é impelida a saltar da segurança do seu casamento por força de um desejo de paixão. Por querer agarrar-se à riqueza que o casamento lhe trouxe, acaba por destruir a sua relação, lidando com a dualidade riqueza e amor. Ele tem sempre uma força presente que “lhe sugere” que não fique com Giovanna, tal é o medo que tem de se entregar a um compromisso tradicional com cujas as leis não compartilha. A estrada é a única solução como fuga à sociedade. Preso por desejar duas coisas antagónicas, Gino acaba por se destruir a si e aos outros.
“Visconti deu (com este filme) o tiro de partida para o neo-realismo sem nunca ter aderido a ele (...). É um melodrama negro, sem porta aberta para um mundo melhor. O trato da História não dá inclinação particular para o optimismo (...). Esta transposição do romance de James Cain tem mais força do que o romantismo e o trágico resulta não do “realismo” mas sim da estilização de uma certa realidade” (Claude Michel Cluny, Ficha Casterman).